Lorrane Oliveira supera luto e dedica medalha à irmã que faleceu há três meses
Era impossível conter o choro. Lorrane Oliveira era, disparado, a mais emocionada entre as cinco ginastas que conquistaram, nesta terça-feira (30), a inédita medalha de bronze por equipes para a ginástica artística feminina do Brasil. Uma reação natural para quem enfrentou um luto doloroso e cogitou até abandonar o esporte após o falecimento precoce da irmã mais nova, Maria Luiza, de 21 anos, há apenas três meses.
Era abril e Lorrane havia acabado de chegar em Troyes, na França, para fazer uma aclimatação com a seleção e conhecer o ginásio que receberia os últimos treinos antes dos Jogos. A notícia a devastou e teve impacto em toda a delegação. Viajou de volta ao Brasil amparada pela médica do COB, Lara Ramalho, que acompanhava o grupo. A ginasta, que já enfrentava um processo depressivo desde 2022, se viu sem chão.
Neste momento a rede de apoio pessoal e profissional de Lorrane se mostrou fundamental para reerguê-la. A área de saúde mental do Comitê Olímpico do Brasil (COB) foi um destes pilares de sustentação e teve o trabalho reconhecido pela ginasta.
“Fiquei umas duas, três semanas sem treinar. Foi difícil. Eu chorava todos os dias. Tinha dias em que eu não treinava, mas as meninas sempre me apoiaram. Às vezes eu não fazia nada, mas só precisava de um abraço e elas estavam ali. Toda a equipe multidisciplinar, principalmente a minha psicóloga Aline (Wolff) e meu psiquiatra Hélio (Fádel) foram essenciais nessa fase. Se não fosse por eles eu não estaria aqui”, disse Lorrane.
Aline e Hélio fazem parte da equipe de sete profissionais do COB da área de saúde mental que estão acompanhando a delegação do Time Brasil em Paris, composta por um psiquiatra, cinco psicólogos e um coach esportivo. Os dois estiveram presentes na Arena Bercy nesta terça-feira e acompanharam todas as movimentações de Lorrane.
“Todo o zelo e carinho que temos com os atletas acaba nos deixando ainda mais próximos deles. Com a Lorrane não foi diferente. Desde o início do seu acompanhamento, fomos capazes de criar um vínculo e relação médico-paciente pautada em respeito, confiança e parceria. Afinal, em saúde mental, os profissionais são a ferramenta - cabe ao paciente, ao atleta, no caso, usá-la a seu favor ou não”, disse Hélio, que completou:
“A Lorrane teve essa sensibilidade de que poderíamos ajudá-la e incorporou os cuidados em saúde mental desde então e foi adquirindo consciência de como é o processo terapêutico (o que estava implicado no curto, médio e longo prazo). E é natural que, às vésperas de uma competição tão importante, direcionemos a condução terapêutica para ajudar a atleta na sua performance e bem-estar”.
Como o Brasil começaria a rotação da final pelas barras assimétricas e Lorrane, especialista, seria a responsável por abrir a série, a pressão era especialmente grande. A tensão aumentou ainda quando Flávia Saraiva sofreu um acidente no aparelho durante o aquecimento, precisando de atendimento médico.
Lorrane tirou 13.000, nota abaixo de sua própria expectativa, mas suficiente para quebrar o gelo da equipe somar pontos importantes para a conquista da medalha. Após o pódio, ela havia sido liberada da obrigação de passar pela zona mista para conceder entrevistas, mas fez questão de se colocar à disposição dos jornalistas. Encarou as perguntas e, mesmo em meio às lágrimas, não se esquivou de falar do período desafiador que enfrentou.
“Eu não me preparei da maneira que eu poderia. Quem me conhece sabe que eu não fiz a melhor paralela que eu poderia. Eu fico triste por isso, mas ao mesmo tempo feliz porque, mesmo depois de tudo o que eu passei eu consegui estar aqui e fazer o meu melhor para representar meu país, minha família e minha equipe e agora somos medalhistas olímpicas e eu pude contribuir para isso. Essa medalha é para todo o Brasil. Em primeiro lugar para Deus e depois para a minha irmã, porque ela tinha esse sonho junto comigo. Ela está muito feliz e orgulhosa de mim, da gente.”