terça-feira, abril 03, 2012

1ª Entrevista com Fabi Alvim

 Fabi Alvim, a líbero de ouro do Brasil

Fabi Alvim

Fabi Alvim, ou Fabizinha, completou 32 anos no último dia 7 de março, carioca de Irajá, é considerada a melhor líbero do mundo. Defende a Seleção Feminina de Vôlei, pela qual já conquistou inúmeros títulos, entre eles o Ouro Olímpico e defende também a equipe carioca Unilever com a qual está disputando as semi finais da Superliga 11/12 contra o Vôlei Futuro. Tive o prazer de conhecê-la pessoalmente em 2010 durante o World Grand Prix 2012 onde vi que além de uma excelente atleta, amada e admirada por jogadores de todo o mundo, ela é uma pessoa super simples, atenciosa e um ser humano nota mil. Conheça um pouco mais sobre essa brilhante atleta:

O que te levou a escolher o voleibol?
Fabi: Na verdade eu sempre gostei de esportes, desde pequena. Minha família sempre gostou muito de futebol, somos todos flamenguistas lá em casa, sempre acompanhei o futebol por causa dos meus pais e em época de olimpíada também. Mas o momento em que eu escolhi jogar vôlei foi na época da conquista do ouro da Seleção Masculina em 1992, em Barcelona. Foi por causa disso que eu optei por esse esporte! Eu fazia atletismo também, gostava de basquete, futebol, mas naquela época, depois da conquista deles, o vôlei virou uma febre e foi quando eu escolhi o vôlei! 


Por quê o líbero não pode ser capitão?
Fabi: É uma pergunta pra fazer pro comitê internacional, porque eu não consigo entender também. A central que entra e sai pode ser capitã. No início, quando a posição foi criada, podia ser, bem no início, no 1º ano. Lembro que a Andréia Teixeira foi capitã do BCN na época. Não sei mesmo dizer o porquê, isso é uma incógnita.

Equipe Rexona-Ades, atual Unilever

Unilever de coração?
Fabi: Sou! (risos) Nada de ir pro Osasco (Risos). Brincadeira! Essa rivalidade que a gente criou é bem bacana, mas temos que carregar junto com ela algumas coisas que é tipo isso, não ir jogar lá (risos). Tenho um carinho muito legal com a torcida do Osasco, eles sempre me recebem muito bem, apesar de eu achar que talvez elas não quisessem me ver de perto, porque a gente vive ganhando deles lá (risos). Mas não é isso, acho que o que vale é o respeito que você trata as pessoas, a atenção que você dá a elas, faz com que elas tenham um carinho por você e eu tenho um carinho por eles, apesar de ser uma torcida adversária, são fanáticos, sempre vão aos jogos, torcem muito e sabem reconhecer quando o outro time é melhor. Mas não me vejo jogando lá! Tenho grandes amigos lá, é um time que possui uma excelente estrutura, o Luizomar é um cara a quem devo muito, principalmente pelo o início da minha carreira, mas eu me vejo aqui no Rio mesmo. É uma identificação que se eu puder, fico aqui até quando o Bernardinho me agüentar (risos)!

Por que motivo sairia do Unilever?
Fabi: Muita gente me perguntou isso depois da olimpíada, até falaram que saiu em um site ai, eu dizendo que tinha a possibilidade de sair do Brasil em 2009. Não é isso! É óbvio que todo mundo se valorizou muito depois dessa conquista e valorizou o voleibol brasileiro e o feminino em geral que já era muito bem visto lá fora. Se me fizesse essa pergunta há um tempo, eu diria que tinha muita vontade de jogar fora por uma questão de experiência, de cultura, financeira, mas hoje, não vou falar pra você que nunca sairia do Rio, mas eu vejo que aqui, ao longo desses quatro anos, que eu construí uma história muito bacana, não só pelas vitórias do time, mas pelo meu crescimento, pela minha identificação, por eu estar jogando em casa, perto dos meus amigos, isso tudo são coisas que hoje motivam na hora de fechar um contrato. Não é só a parte financeira, existem outras coisas importantes a serem vistas. Eu vou esperar. É um ano bacana, torço pra que aconteçam muitas tentações pra mim, como pra todas as meninas, porque é uma forma de você ver o vôlei valorizado. Não tenho a intenção de sair daqui, só se fosse uma coisa muito bacana que financeiramente falando, valeria muito à pena, mas não pesaria somente esse lado para tomar a decisão.

Fabizona e Fabizinha pela equipe carioca Unilever

Você tem como característica marcante a simpatia. Já passou alguma situação engraçada ou constrangedora com os fãs por causa disso?
Fabi: Olha, não! Assim, tem alguns que abusam. Mas eu me saio super bem dessas situações sabe? Eu sou carioca esperta sabe? (risos) Tento sair sempre numa boa. Acho que faz parte, os fãs é quem estão ali pra te apoiar, pra valorizar teu trabalho. Daqui a 10 anos vou parar de jogar vôlei e tenho certeza que vai ter um ou outro fã que eu terei contato. É importante manter isso. Tem uma menina que fez um site pra mim e ela nunca tinha me visto na vida sabe?! E ai encontrou comigo em Araçatuba. Acho que o mínimo que você pode fazer é ser educado, retribuir o carinho, isso pra mim é o mínimo. E o máximo é entrar em quadra e fazer o seu melhor pra que a gente conquiste mais fãs. Mas já houve sim situações diferentes. Tem jogadoras que acho que tem mais problemas. A Sheilla e a Mari, por exemplo, devem ter mais problemas que eu, mas eu me saio muito bem. Sempre tem uns malas né?! Não tem jeito (risos). Mas são raros. Os problemas que surgem a gente sai rapidinho!

Você acha que a atitude exagerada de alguns fãs, afasta as jogadoras da torcida e até mesmo, da liga nacional?
Fabi: Tem gente que consegue seu telefone, te perturba, vai na sua casa, que faz plantão, eu acho que isso já é extrapolar um pouco. Se você puder ter um relacionamento bacana com os seus fãs como eu tenho com a maioria dos meus, e tenho com pessoas que nem são fãs minhas, é tranquilo! Eu já fui torcedora, então acho que é legal ter um bom relacionamento com os torcedores porque quando a gente não trata bem é ruim pra pessoa, é uma coisa frustrante. Você se prepara pra assistir um jogo, espera pra falar com a pessoa e ela não te dá uma atenção?! O mínimo que você pode fazer é dar atenção, é ser educada. Mas ao mesmo tempo, não sei se isso afasta as jogadoras não, mas assusta um pouco, principalmente as pessoas que não tem essa facilidade de ter um relacionamento bacana com o seu fã. Tem gente que é tímido, que não tem essa coisa e aí as pessoas confundem um pouco a timidez com metidez. A Mari, por exemplo, é uma pessoa que tem esse jeito, que passa pras pessoas a sensação de ser fria, mas ela é super divertida e talvez tenha um pouco de problema com fã, porque ela é um pouco retraída. Mas ela planta uma pessoa que não é, é completamente diferente do que ela parece ser. Acho que isso é uma defesa dela e ela no dia a dia é uma pessoa muito engraçada, muito extrovertida, brincalhona, coisa que você dificilmente vai ver fazer dentro da quadra, talvez em treinos, mas mesmo assim é só pra quem conhece, é a convivência. Nós duas somos duas palhaças, a gente se dá muito bem!

A tão sonhada medalha de ouro olímpica

O que mudou na sua cabeça depois do ouro olímpico?
Fabi: Eu continuo fazendo as mesmas coisas! Nos treinos continuo com muita motivação. Mas é difícil dizer pra você que não mudou nada, é lógico que mudou! As pessoas te reconhecem mais na rua, valorizam o teu esforço, isso é muito bacana. Acho que muita gente parou pra ver aquele 23 de agosto. O fato de a gente ter perdido algumas finais, mobilizou muita gente e, podermos trazer de volta a credibilidade pras pessoas foi muito legal. E acho que é isso que muda. É uma medalha que eu vou ter na minha casa que é pra minha história independente se vão lembrar disso pra sempre. O importante é termos a nossa história, de repente, daqui a 10 anos, as pessoas podem não lembrar com tanta freqüência da Mari, da Sheilla ou da Fabi, vão lembrar porque nosso nome tá na história, mas eu vou ter história pra contar pra minha família e são momentos que ficam na minha cabeça que, vira e mexe eu to dirigindo e eu me lembro de algumas coisas, de cenas, porque nunca mais vamos viver um momento como esse. Por mais que a gente ganhe outra medalha, aquela vai ter um sabor especial e por ter sido da maneira que foi, por ter sido inédito, por estarmos ali representando algumas gerações é que se torna tão bacana. Mas no meu dia a dia pouca coisa mudou. Eu continuo indo a praia (risos). De vez em quando temos alguns privilégios que as pessoas acabam dando quando nos reconhecem, como um desconto (risos), mas isso é raro (risos). Mas não mudou muita coisa não. O mais legal é que hoje eu tenho uma coisa a mais pra mostrar pras pessoas, que tem um valor simbólico inenarrável e inesquecível!

Em geral, a sua posição não recebe todos os méritos que merece. Existe uma desvalorização do líbero no mercado?
Fabi: Se você me perguntasse isso há uns três ou quatro anos, realmente o líbero era a última peça a ser contratada. Acho que com o crescimento da responsabilidade, com as pessoas vendo a importância que é ter um bom líbero, tecnicamente falando e, principalmente de atitude e de personalidade, eu acredito que essa mentalidade vem mudando um pouco. Mas ainda é visto como mais um jogador e não como o jogador. Na minha opinião já houve mudança, hoje em dia, principalmente os técnicos, que talvez sejam os principais mentores dessa idéia de contratação, já percebem que ter um bom líbero hoje no seu time é tão importante quanto ter uma boa levantadora, uma boa atacante, enfim, esse é um conceito que vem sendo revisto, tá engatinhando ainda, acho que o líbero pode ser mais valorizado e, o que eu puder fazer pela minha posição, pelos líberos em geral, eu farei!

Fabizinha em ação pela seleção

Qual o melhor jogo e o pior jogo da sua carreira?
Fabi: O melhor acho que foi contra a República Dominicana, no Grand Prix 2008 (foto), na 3ª fase, em Macau. Estávamos perdendo de 2 x 0, pra uma equipe que teoricamente não tinha a menor chance de ganhar da gente e foi um momento em que pensamos que o nosso foco era a olimpíada, mas que tínhamos que focar no Grand Prix também, então resolvemos jogar, arrumar força. Foi um momento muito importante pra tudo o que conseguimos conquistar, foi um jogo que deu um estalo em todo mundo de que estávamos a um mês de uma olimpíada. Agora um jogo difícil que eu posso falar, é um jogo muito triste na verdade. Não vou nem dizer que foi jogado mal ou jogado bem, mas um jogo muito triste. Óbvio que é uma derrota e que foi muito triste pra mim, foi o jogo do Pan Americano. Perdemos o mundial também, ficou marcado na memória, porque foi uma competição que tínhamos muita chance de ganhar, mas o Pan foi aqui né?! Em casa, no Maracananzinho e tava toda mundo ali, minha família, meus amigos, tinham muita gente torcendo pela seleção feminina. Aquele jogo pra mim foi um dos mais tristes, um jogo que eu demorei muito pra conseguir dormir uma noite inteira sem ficar com lances da partida na cabeça. Eu senti muito aquela derrota. Tenho alguns amigos em particular na seleção que me conhecem muito bem, como a Sheilla, a Mari, a Paula, Sassá, Fabizona e nós vivemos muita coisa nesses anos todos. Às vezes jogamos juntos por um tempo na seleção e ai vai cada uma pro seu clube e acaba que ficamos um tempo sem falar e, quando a gente encontra, temos uma empatia, uma coisa muito bacana entre nós. E entre todas ali, só tinha eu e a Thaisa de cariocas, e acho que talvez eu tenha sentido mais, porque eu sabia o que significava o Pan Americano no Rio de Janeiro, o quanto era difícil fazer um campeonato desse porte, de nível mundial dentro do Brasil, o quanto as pessoas trabalharam para que o evento acontecesse e tinha muitos amigos, muita família, muita gente que merecia uma vitória nossa ali e nós mesmos. Mas eu te digo que tudo acontece na hora que tem que acontecer. Aquele foi o pior ano da seleção feminina da nossa geração, o corte da Mari, passamos por umas coisas muito difíceis. Se me perguntassem se eu trocaria algo nesses quatro anos, eu trocaria sim, eu quero ganhar sempre, dói perder, mas se você me dissesse que o final dessa história seria a medalha de ouro de uma olimpíada, eu acho que valeria a pena passar por tudo o que aconteceu. Nós fomos muito criticadas né?! Desde que chegamos à seleção em 2005 a gente responde perguntas sobre Atenas e algumas de nós nem estava lá. E eu, por falar demais sempre, to sempre ali tentando responder uma coisa que talvez nem tenha explicação. Mas acho que tudo fez parte. 

Seleção durante os Jogos Pan-Americanos de 2007

Esse ano você completa 16 anos dentro de quadra. Começou jogando em Irajá, depois foi pra Flamengo, passou pelo Macaé, Vasco, Campos até que chegou ao Rexona-Ades, onde está desde 2005. Pela equipe carioca conquistou 3 Campeonatos Carioca, 2 Salonpas Cup, 1 Copa do Brasil e 4 Superligas. Na Seleção Brasileira desde 2002, foram inúmeros os títulos e prêmios conquistados, entre eles, talvez o mais importante, o Ouro Olímpico em Pequim. Falta conquistar alguma coisa?
Fabi: Falta o próximo campeonato né?! (risos). Me perguntam isso de vez em quando, eu sou uma pessoa que gosto de ler, de tá sempre informada, e me lembro que há 4 anos perguntaram pro Bernardo o que o motivaria a seguir na seleção, ele já tinha sido campeão do mundo, campeão olímpico, que naquela temporada ele já tinha conquistado tudo. Ai ele respondeu isso, que o que o motiva era a próxima competição. Se você for comparar um título de jogos abertos do interior com o título de uma olimpíada, você vai falar ‘’você tá brincando comigo né Fabi?!’’, mas o que move o atleta é isso, é o próximo campeonato. É o jogo, é você jogar bem, se preparar e a gente sabe que a história não pára ali e queremos construir uma. Esse ouro olímpico é um capítulo da nossa história, pelo menos da minha, do que eu penso pra mim. Ainda quero buscar algumas coisas e, pra isso, os próximos campeonatos fazem parte e são sempre os mais importantes!

Diga o nome de uma pessoa que você admira.
Fabi: Ih tem tanta gente que eu admiro! Eu sou fã do Zico. É m cara que pra mim é um exemplo de tudo, de simpatia, de jogador, de ídolo que ele foi. Difícil escolher um. No vôlei, como eu falei antes que o que me motivou a escolher o vôlei foi aquela geração que ganhou a olimpíada de Barcelona e por depois eu ter jogado nas categorias de base do Flamengo, eu tive a oportunidade de conviver com ele, era o Tande. Um cara que eu gostava muito e que hoje se eu o encontro, ele me trata como uma amiga. Outro dia até brinquei com ele ‘’Pô, você lembra que há 10 anos eu tava lá catando bola?’’ ai ele disse que lembrava. Gosto muito da Shelda também. Vem na minha cabeça muita gente, é difícil sabe?! Mas esses que eu te falei são pessoas que em algum momento me fizeram parar pra prestar atenção nelas.


Ouro olímpico e Flamengo, duas paixões da atleta
Depois que deixar as quadras, gostaria de continuar trabalhando com vôlei, em outra função? Qual?
Fabi: Eu me vejo nessa área, mas não parei pra pensar o que eu faria. Mas me vejo fazendo algo pro vôlei, pelo vôlei. Porque é difícil pensar em outra coisa né?! Eu tô jogando vôlei há 14 anos, não, 15 anos na verdade, então eu vivi isso intensamente por todo esse tempo. Pretendo continuar ainda por uns 6 ou 7 anos. Então é muito tempo da sua vida que você se dedica a algo. Eu quero poder fazer alguma coisa pelo esporte e, quem sabe também, continuar vivendo de vôlei. Não vejo trabalhando sentada em uma cadeira, atrás de uma mesa em um escritório fechado, acho difícil isso acontecer.

Você está no melhor momento da sua carreira?
Fabi: Acho que sim. Estou no momento em que me sinto mais feliz em todos os aspectos, estou mais madura. Não acho que esteja velha, mas me sinto uma pessoa madura. Vou fazer 29 anos, sei que to chegando perto dos 30 (risos), mas o que eu mais vejo são as pessoas falando da minha alegria, que é o que eu quero levar como uma marca minha. A minha vibração dentro de quadra, o fato de acreditar sempre em todas as bolas, até naquelas que não são tão possíveis! Eu tô feliz com o que eu faço que é jogar vôlei e é o que eu mais amo fazer. Acho que estou no meu momento mais feliz sim com a minha carreira, eu não sei dizer se é o melhor momento, mas é o momento mais feliz. Ainda espero viver outros momentos felizes e bacanas como o de agora. Mas se você me perguntar se é o momento mais feliz, eu diria que sim. Quero viver momentos de felicidades mais intensos, mas esse é o momento que eu diria dúvidas nenhuma, que valeu a pena passar tudo o que passei pra tá vivendo isso agora.

Fonte: Equipe Marianne Steinbrecher